Camilo Cristófaro é cassado acusado de racismo

Com 47 votos a favor, 5 abstenções e nenhum contra, e um ausente, dentre os 53 vereadores presentes, de forma presencial ou virtualmente, na sessão desta terça-feira (19), o agora ex-vereador Camilo Cristófaro (Avante) foi cassado e não poderá mais atuar em seu cargo.

A decisão foi tomada na Câmara dos Vereadores, por conta de uma fala racista de Camilo, proferida em maio do ano passado. A maioria dos vereadores, tanto de esquerda, quanto de direita, foram categóricos em seus votos, no combate efetivo ao racismo.

Era necessário que 37 vereadores votassem a favor, para que Camilo perdesse seu mandato. Dez a mais, foram favoráveis à perda do cargo de vereador.

Em 3 de maio de 2022, em um áudio vazado durante a CPI dos Aplicativos, Cristófaro teve um áudio vazado, no qual proferiu a seguinte frase: “Eles arrumaram e não lavaram a calçada. É coisa de preto, né?”

Camilo foi o primeiro vereador a ser cassado, em São Paulo, por conta de racismo.

A defesa do ex-vereador teve duas horas para proferir sua tese. Durante a fala, o advogado, Ronaldo Andrade, questionou a imparcialidade do julgamento, alegando que esta seria “formal”, expondo que também é contra o racismo, mas a fala de Cristófaro foi colocada “fora de contexto”, foi “infeliz”, mas alegando que não houve nenhum dolo e ela havia sido proferida a um amigo seu “de 40 anos”, por isso não deveria ser cassado.

Cristófaro também discursou e novamente negou ser racista. Exaltado, chegou a chamar de mentirosa, Luana Alves, vereadora do PSOL, dizendo que o partido no qual ela é filiada gosta de “Luz, câmera e ação”. “É o que o PSOL sabe fazer”, disse.

Foi Luana quem interrompeu a sessão, em 2022, após a fala racista de Camilo, pediu a gravação do que ele havia dito, levou o processo para a corregedoria, o Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), onde o processo ainda está correndo.

Ele também se dirigiu ao corregedor da Câmara de São Paulo como “mentiroso e covarde”.

A decisão da cassação será comunicada a Justiça Eleitoral e foi comemorada por grupos antirracistas que estiveram presentes na Câmara. A vaga de Camilo será assumida por Adriano Santos, ex-PM e segundo suplente do PSB, que poderá assumir a vaga a partir de amanhã.

“É histórico, porque significa a força do movimento negro. A força dos que lutam contra o racismo todo dia e infelizmente estão muito acostumados a ver a impunidade, ver racista a vontade, então o que a gente viu ali [na Câmara] foi uma vitória mesmo. Uma vitória coletiva. Eu fico muito honrada de poder ser parte e porta-voz dessa vitória. Eu fico honrada mesmo”, contou a vereadora Luana Alves, à equipe de reportagem do Jornal Ipiranga News.

Em relação às falas ditas a ela por Cristófaro, ela fez questão de dizer que “o vereador fez uma defesa com muitos ataques pessoais, falou mentiras, diálogos, frases que não existiram, então eu que infelizmente, já conhecia como funciona o vereador”, disse.

Me controlei ali [durante a sessão, quando Camilo proferiu palavras a ela], porque eu sabia também que ele estava fazendo aquela baixaria tentando uma resposta minha, porque se eu respondesse ele ia conseguir atrasar a sessão. Eu sei que era isso que ele estava tentando fazer. Eu sei que é uma tática regimental, falar muitos absurdos, para tentar se livrar. Não é a primeira vez que ele mente para mim”, completou Alves.

Elaine do Quilombo Periférico, também vereadora do PSOL e grande liderança no combate ao racismo, conversou com a reportagem. Emocionada, ela ficou muito feliz com a decisão, mas destacou: “as pessoas não estão felizes porque alguém perdeu um mandato. A gente tem muito respeito pelos mandatos legislativos que têm aqui nessa casa. As pessoas estão felizes porque é um momento histórico. Pela primeira vez, um parlamentar é responsabilizado por um crime de racismo que comete em um espaço como esse [Câmara dos Vereadores]”.

“Eu acho que é um recado importante que a gente dá. Espaços como este não podem permitir que o racismo, que está sim, enraizado na sociedade, mas que não é invisível, continue passando por este espaço como se não fosse nada. Eu acho que vieram muitas lutas antes dessa, e esta é parte de uma luta muito maior, que é uma luta por igualdade racial e é isso que a gente está comemorando hoje: mais um, dos extensos passos, que o movimento negro tem conquistado e eleger parlamentares para estar neste espaço e defender as pautas raciais é uma atividade organizada do movimento negro, que quer dar um basta e construir uma sociedade antirracista e boa para todas as pessoas”, aponta ainda Elaine.

“É um grande exemplo para o país. Uma grande capital, mostrando que o racismo não tem espaço. É preciso que todos nós pratiquemos isso a todo momento. Todos os dias. Uma defesa da cidadania e da igualdade de todos os seres humanos dessa terra. Não é possível convivermos mais com o racismo”, afirmou à imprensa o presidente da Câmara Milton Leite.

À equipe de reportagem do Ipiranga News, ele destacou a lição que a cassação de Camilo Cristófaro deixa para a Câmara e toda a população em relação ao combate ao racismo. “Essa casa é uma casa política. Ela é sensível à sociedade como um todo. Ela não aceita essa natureza da prática do racismo, que está encubada na sociedade e nós precisamos aculturar a sociedade de uma maneira diferente, que conviva de uma forma harmônica, brancos e negros, diferentes raças, sexo, origem ou aquilo que possa ser. Então, nós não toleramos isso. É importante para essa casa aqui dar o exemplo para a sociedade que ela não tolera. É uma casa política, mas essa casa é um reflexo da sociedade. Aqui, nós refletimos o que acontece efetivamente na sociedade. Foi espelhado hoje no plenário”, pontuou.

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